domingo, 17 de fevereiro de 2013

Tu me amas?

JO 21, 15-19

Às vezes, nosso coração parece crer que estamos sozinhos. A solidão persegue a humanidade porque é próprio do homem não querer estar só. Alguns gostam de reformular suas respostas em teorias cuja comprovação ainda permanece no limbo embora gostem de dizer o contrário.

Talvez, sim, tenhamos tanta vontade de ter alguém por conta da insegurança da vida primitiva, das ameaças que o homem primitivo enfrentava e que com os quais não podia enfrentar sozinho. Entretanto, o próprio embate entre o homem e a natureza reflete o texto bíblico. Fomos separados do Paraíso. O que também significa que fomos separados de Deus.

É sabido que o pecado cometido por Adão e Eva é a razão de nosso consequente afastamento do Criador. Separar-se de Deus também é perder nossa identidade e nossa plenitude, uma vez que fomos feitos à sua imagem e semelhança, logo, é Ele a nossa companhia. Vivemos em busca de Deus, e é esse nosso verdadeiro anseio: nos encontrar com Aquele que nos criou. Esse encontro entretanto é recheado de altos e baixos porque afinal de contas fomos concebidos sob o pecado. O pecado é o alicerce dessa sociedade em que fomos nascidos e criados. Se não houvesse essa ruptura entre Adão e Eva e o Éden que representa a comunhão plena com Deus Pai, esse mundo tal como conhecemos não existiria. Está aí o motivo de nossas fraquezas. Fomos formados num berço distorcido, cheio de valores falsos com os quais nos acostumamos. Essa tendência natural ao erro é que a Igreja chamará de concupiscência.

É esse sentimento de afastamento do Senhor que tomou conta dos apóstolos do Senhor o momento em que ele ascendeu aos céus. O Mestre querido que lhes proporcionou o contato direto com Deus (Jo 14, 9). Cristo preenchia toda a nossa saudade do Pai. Nossa ansiedade pelo Criador é plenamente satisfeita em seu Filho que nos redimiu. Mas, o Senhor partiu. E é certo que aquele sentimento humano de estar só no universo voltou. De modo muito especial a Pedro. Pedro havia negado a Cristo três vezes em sua peregrinação que o levaria à Cruz. Pedro tinha um motivo especial por sentir a falta do seu Senhor. Ele não havia se reconciliado com Cristo.

É o mesmo sentimento de muitos que perdem seus entes queridos sentindo que faltou em algum momento com eles. Por isso mesmo, devemos nos exortar à reconciliação assim que erramos com nossos pais, filhos, irmãos e amigos. Mas, principalmente, não devemos demorar em pedir perdão a Deus quando nos afastarmos Dele. Estar longe de Deus aumenta o vazio do qual o pecado se alimenta. Quanto mais longe de Deus estamos, mais longe devemos ficar. Por esse motivo, Cristo volta. Não apenas para instruir seus discípulos, mas para ter sua própria reconciliação com seus amigos.

O retorno de Cristo seria definitivo para a vida de seus discípulos. Era a marca de que a partir de então Ele os acompanharia mesmo que não se o visse. Mas também era marcado do momento sublime da reconciliação que Ele pretendia ter com Pedro. Pedro se sentia abandonado. Perdido. Voltara inclusive às funções de pescador que havia abandonado assim que conheceu o Senhor. É normal que às vezes nos sentindo abandonados por Deus queiramos esquecê-lo, apagar de nossas vidas e da nossa rotina tudo que nos obrigasse a vê-lo. Principalmente, porque em nossa humanidade não consentimos em pedir perdão a Deus. Sabemos que, se nos sentimos abandonados por Deus é porque nós abandonamos a Deus. É a mesma questão em que se encontravam Adão e Eva quando se esconderam de Deus. A vergonha de ter errado com alguém nos faz automaticamente fugir desse alguém, porque é necessário que voltemos à nossa realidade e à nossa condição de erro, de fraqueza, de incapacidade, para nos reconciliar.

Este é portanto o momento mais favorável à leitura de Jo 21,15-19. A Quaresma é o momento em que precisamos voltar à praia e esperarmos ansiosamente pelo Nosso Senhor, nos inclinarmos e ouvirmos a sua voz com toda a nossa humanidade e consequente fraqueza. Precisamos ouvir a pergunta que Nosso Senhor Jesus Cristo nos faz: Pedro, Victor, Maria, Ana, Paulo, João, tu me amas? Em outras palavras, você está disposto a voltar para mim? Eu te peço, você que está lendo esse texto. Nesse momento, ouça a voz do Senhor Jesus que lhe pergunta em claro e bom tom. Você o ama?

Antes de responder. Precisamos nos voltar à leitura. Sei por outros pregadores, em especial pelo Pe. Léo, que a resposta de Pedro não é aquela que o nosso imediatismo nos obriga a dizer. Não, Pedro não disse que o amava de fato. Pedro reconheceu que se o amasse com amor puro e verdadeiro não o negaria, não voltaria à vida de pescador, tampouco se sentiria tão abandonado e sozinho como se sentia. Por isso que eu disse que é necessário que voltemos à nossa realidade. Não podemos mentir para Deus. Não porque o enganamos mas principalmente porque nos enganamos. Diga a verdade para Deus. 

Senhor, se eu te amasse mesmo eu não erraria com o Senhor. Mas eu te quero imensamente. E quero te amar verdadeiramente. Eu quero te amar por completo.

Ah! Como isso é agradável a Deus! O que Deus não quer é um ser humano pronto. Ele quer uma pessoa que seja incompleta e esteja disposta a se completar. E só Deus nos completa, meu irmão!

A resposta de Cristo porém é que torna tão lindo ser cristão. Cristo não quer que ao voltarmos para Ele nos voltemos para Ele. Precisamos nos voltar para aqueles que estão ao nosso redor. E é muito difícil, irmão, a missão a que Cristo nos confere: "Cuida das minhas ovelhas." Deus quer que nós cuidemos uns dos outros. E dos outros que não cuidam de nós.  Se a nossa resposta é a resposta acima não podemos ficar em uma cristandade pobre e pequena que se estabelece num círculo em que só se encontram Deus e a mim. Jesus se propôs a uma vida inteira de dedicação às pessoas. Essa era também a forma de Ele amar ao Pai.

Cristo fez essa dinâmica com Pedro em número determinado: três. Lembrava às três negações de Pedro porque era o número de faltas que Pedro tinha com Ele. Mas o número três também nos remete à perfeição da Trindade. Ora, nossa vida inteira é recheada de erros e faltas para com Deus. Para cada uma delas, precisamos ouvir a voz de Cristo que nos impele a tomar a decisão.

Enfim, o sentimento de solidão é resultado desse abandono Daquele que é nossa verdadeira companhia: o Único que pode estar conosco o tempo todo. Precisamos ouvir aquela pergunta de Cristo para, assim, reconciliarmo-nos com Ele e pôr fim ao sentimento de abandono. Se a ouvirmos, daremos um passo para que, em momento oportuno, digamos: Sim, Senhor, eu te amo!